
Instalar-se, deslocar-se num
país diferente do seu, sem saber se o futuro será, de fato, melhor que o
passado é uma situação dramática. A fala do capitão do navio de imigrantes é
também uma metáfora: “Eu não gosto nem um pouco quando sou obrigado a vagar
para cá e para lá, igual àquela vez no bosque com meu pai, sem saber onde vou
poder enfim atracar. Isso não é humano, senhora”. A integração é algo vistoso
no discurso, mas na realidade está posta num abismo, cercada por um muro, na
maioria das vezes invisível: “Um duelo sem final que travavam há muito tempo,
uma peça a mais no muro que construíam entre si, afastando-se para mundos
intransponíveis nos quais algum dia talvez não pudessem mais se reconhecer
mutuamente”.
A rejeição sofrida, mostra o
autor, não é somente um drama para o refugiado, mas a prova de que o ser humano
que rejeita outro gratuitamente é um adoentado num mundo débil: “Talvez
tenhamos. Talvez todos os homens tenham a peste”.
Ao tratar de imigrantes alemães no Brasil, seja em Belo Horizonte,
cidade natal do autor, ou em outros lugares do país, João Batista desfila
referências a grandes nomes da literatura e da cultura de língua alemã: Goethe,
os Irmãos Grimm, Wagner, Mann, Freud, Remarque, Musil, Heine, Brecht, Fritz Lang e
por aí afora. Sem esquecer, evidentemente, da cerveja e dos mestres
cervejeiros, responsáveis por esse elixir dourado que faz o mundo todo reverenciar
a Alemanha.
Não são as únicas, mas Belo Horizonte e Berlim, são cidades especiais
para o romance. A primeira, com suas contradições, aparece também retratada por
personagens históricos: “João Paulo II ergueu os braços para abençoar a cidade
com a frase “que belo horizonte”, quase ao mesmo tempo em que o poeta Drummond
a chamava de “triste horizonte”. Já a
capital alemã: “Berlim era o labirinto. Mas o Minotauro não esperava no meio
das ruas repletas de carros ou entre os prédios novos que se intercalavam às
edificações históricas. [...] Berlim era o labirinto. E não adiantariam marcas
no caminho, novelos de lã ou restos de
pão como nos mitos e contos de fadas”.
João Bastsita não se aventura em experimentalismos e tem linguagem
apurada para falar de tragédias, como a queima de livros: “Ideias carbonizadas.
Sentimentos em cinzas”. Procura não cair nas armadilhas da indústria cultural
que jamais esgota a monótona repetição do mesmo. Prudente, faz parte do
prestigioso elenco das letras de um dos estados mais fecundos do país: “E os
nativos de Minas Gerais são muito cautelosos”.
por Flavio Quintale
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