segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Infância em São Paulo

Quando fui criança em São Paulo tinha bastante mais que nada, mas muito menos que tudo. Meninos de classe média são os menos livres. Os ricos vão para Nova York, Londres e Paris, ou quando ficam, vivem em condôminos fechados, mansões muradas com cercas eletrificadas, guardas armados, e vigiados dia e noite por guarda-costas e câmeras de circuitos fechados para não serem sequestrados. Os pobres perambulam pela cidade e voltam talvez à noite para os barracos miseráveis, quando não são mortos. Se não estão no tráfico ou na prostituição, são mão de obra quase gratuita na economia informal. Vendedores de balas e chicletes ou lavadores de para-brisa nos semáforos. Eu sobrevivi asfixiado, porque a família tinha dívidas para pagar, e preso perpetuamente no nosso sobradinho, paralisado, pelo pânico de viver, pânico do crime, pânico de não ter trabalho quando crescesse, nem carro, nem casa, nem nada, clamando pela paz, bem alto das grandes da sala, cheio de medo da ameaça dos monstros do delito. Minha única chance de liberdade era vestir a roupa do Superman que minha mãe costurara, ela mesma, e pular do quinto degrau da escada com o braço estendido bradando, repleto de alegria: para o alto... e avante!

do "Livro dos Textículos" de Flavio Quintale 

2 comentários:

  1. O HOJE COMEU O ONTEM ......em qualquer lugar do MUNDO . QUE PENA !!!!

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  2. Em Portugal os meninos ricos sempre tiveram muita inveja dos meninos pobres porque estes brincavam na rua. Jogavam à bola, ao berlinde, com os carrinhos de rolamentos, partiam os vidros das janelas das vizinhas rsrsrsrs. A única autoridade que aparecia de vez em quando era um policia chamado pelas vizinhas que no final tinha que se ir embora sem ver nada de anormal. Pareciam pardais à solta:https://youtu.be/GDZE121nwkg. :D :)

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